segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Educação: um princípio fundamental

«Empregai toda a energia para adquirir tanto perfeições interiores como exteriores, pois o fruto da alma humana tem sempre sido, e sempre será, perfeições internas e externas. Não é desejável que o ser humano seja deixado sem conhecimento ou habilitações, pois será, então, nada mais que uma árvore estéril. Assim, tanto quanto o permitam as vossas capacidades e aptidões, deveis adornar a árvore do ser com frutos como a sabedoria, o conhecimento, a percepção espiritual e a fala eloqüente».
Bahá’ú’lláh
Nos últimos cem anos a palavra educação tem sido uma das mais comentadas, elogiadas e lamentadas dentro do vocabulário moderno. Em poucos anos, a humanidade passou de uma época em que a maioria dos reis não sabia ler, ou não desejava saber ler, até ao presente, quando, ao contrário do passado,  incontáveis organizações declaram ser a educação um direito incontestável de todas as pessoas, sejam elas ricas ou pobres, meninos ou meninas, jovens ou idosos, camponeses ou citadinos. Existem atualmente grandes complexos educacionais compostos por milhares de prédios escolares, professores e alunos. As catalogações de material didático incluem milhões de ferramentas, desde a tampinha da garrafa até aos computadores mais sofisticados. Mesmo os países mais pobres possuem uma infra-estrutura educacional e contribuem para o mundo, criando filósofos, cientistas, artistas, educadores e estadistas. Nos países onde os recursos permitem, a educação formal pode ser proveitosa para toda a população, desde a mais tenra idade até ao fim da vida.
Entretanto, é um fato reconhecido a existência de uma crescente desilusão com a "educação". Em muitos países desenvolvidos, números alarmantes de alunos deixam os estudos no primeiro momento permitido por lei. Mesmo em países em desenvolvimento a insatisfação concorre com os fatores econômicos para tirar os alunos das escolas. Por seu turno, os educadores e legisladores procuram reagir a essa tendência criando mudanças na estrutura educacional, reorganizando os currículos,  buscando novos materiais escolares, etc, mas nem eles próprios estão satisfeitos com os resultados até agora alcançados.
A grande verdade é que a chave do problema encontra-se exatamente nos resultados que a educação deveria trazer. Esta gigantesca máquina educacional, com milhões de horas de aulas e estudos, não levou os alunos a responder às perguntas básicas e mais importantes das suas vidas. Quem somos? Por que fomos criados? Para onde vamos? No nosso entusiasmo para encontrar a pedra mágica, acabamos por nos esquecer que a educação, como qualquer ferramenta, não pode responder às perguntas do "porquês?". Para obtermos tais respostas é necessário virarmo-nos para a Religião, que é a fonte mais profunda de motivação e segurança do indivíduo, como também a força geradora de civilização para os povos.
Através dos tempos, os Fundadores das grandes religiões, como Buda, Moisés, Cristo, Maomé, Bahá´u´lláh e outros, ensinaram à humanidade o propósito das nossas vidas e como tal propósito  poderia ser alcançado. Nos Livros Sagrados, encontramos os princípios morais e éticos que orientam o uso adequado de qualquer ferramenta, inclusive as altas tecnologias que, hoje, estão ao nosso alcance. No BagvadGita, no Velho Testamento, no Novo Testamento, no Alcorão, e nas Escrituras Bahá´ís são destacadas as qualidades individuais do ser humano, como a compaixão, a equidade, a bondade, e tantas outras que o homem deve adquirir. Certamente, a aquisição dessas virtudes deve fazer parte fundamental de todo e qualquer processo educacional. Mas, na medida em que criamos estruturas sociais, mais e mais abrangentes, cresceram também em importância os problemas sociais e inter-pessoais. A Religião tem-nos  ensinado como conviver harmoniosamente em famílias, tribos, cidades e nações, criando instituições baseadas na justiça, obediência, colaboração mútua e crescente consciência social.
Hoje em dia também a orientação para a vida social provém da Religião. Neste momento histórico, quando as perguntas dos "porquês?” chegaram ao ponto de não somente desequilibrar inúmeros indivíduos, mas também a sociedade inteira, levando-a ao ponto de pôr em perigo a sua própria existência, Bahá´u´lláh proclamou os princípios sociais e éticos adequados para o ser humano enfrentar tais desafios. Bahá´u´lláh proclamou a unidade do gênero humano como o ponto focal ao redor do qual encontraremos a solução dos nossos problemas sociais:
"O bem-estar da humanidade, sua paz e segurança são inatingíveis, a menos que, e até que, a sua unidade esteja firmemente estabelecida."


3 Tipos de Educação
Qualquer "educação" baseada em perspectivas limitadas, lealdades parciais e conhecimentos fragmentados, não pode satisfazer o ser humano, que intrinsecamente tem anseios universais, esperanças celestiais e sentimentos globais. Há que educá-lo para ser uma criatura confiante do seu lugar no universo e pronto para contribuir com os seus talentos para o progresso de toda a humanidade.
Pela primeira vez na história das grandes religiões, o próprio Fundador de uma Religião destacou a Educação como uma lei divina e traçou as linhas gerais de uma filosofia educacional adequada para esta época. Nas Escrituras bahá´ís são definidos três tipos de educação, ou seja, a material, a humana e espiritual.


A educação material trata dos cuidados do corpo, seu bem-estar e conforto. Neste aspecto da educação pode-se incluir as áreas de higiene, limpeza, abrigos, vestimentas, educação física, desporto, alimentação e as ciências da saúde. Nas diversas culturas por todo o planeta estes assuntos recebem tratamentos variados, portanto está evidenciado de alguma maneira, e formam parte da nossa herança universal.
As crianças porém, devem receber instrução sobre o funcionamento e os cuidados que o corpo e os demais elementos do meio ambiente físico necessitam. A natureza possui as suas leis e estrutura geral. O papel da educação é gerar o melhor entendimento destas leis para que possamos obedecê-las e aproveitá-las tanto para nos proteger, como para fazer descobrimentos que levarão avante a civilização.


A educação humana inclui as atividades sociais e humanísticas que fazem parte da civilização, como o governo, administração, obras de caridade, profissões, artes e ofícios, ciências, e, grandes invenções e descobertas. A atuação nestes campos permite a expressão cada vez mais profunda das faculdades intelectuais. Assim aprendemos a funcionar nas diversas instituições sociais de crescente complexidade e abrangência, como a família, as tribos, as cidades, o estado-nação e, hoje, chegou a hora de aprendermos como viver nesta nova fase de unidade mundial.

A educação espiritual
«Considerai o Homem como uma mina rica em jóias de inestimável valor. A educação, tão somente, pode fazê-la revelar os seus tesouros e habilitar a Humanidade a tirar dela algum benefício».
Bahá'u'lláh
Cabe aos educadores serem mineiros, trazer à superfície as belezas ocultas do ser humano. A própria natureza humana é curiosa, investigadora, racional, responde naturalmente ao estímulo, para o cumprimento deste princípio.
Se pensássemos bem na alegria que uma criança mostra após a aprendizagem de um novo conceito ou habilidade, ficaríamos certamente admirados ante a satisfação que o conhecimento lhe pode trazer. Portanto, a aquisição de qualidades como o amor, a justiça, a compreensão, a honestidade, e outras, causa não só a alegria e satisfação da própria pessoa, como também de todos ao seu redor. Além disso, a contribuição dos seus talentos à humanidade pode ser motivo de felicidade para todos os habitantes do planeta.

O propósito da educação

seleção dos Escritos Bahá’ís

A importância da educação
"... a educação não pode alterar a essência íntima do homem, mas, efectivamente, exerce influência formidável e, com esse poder, pode fazer manifestarem-se no indivíduo quaisquer perfeições e capacidades que estejam  depositadas dentro dele.” ‘Abdu’l-Bahá

Educar enquanto criança
"É extremamente difícil ensinar o indivíduo e refinar o seu carácter uma vez passada a puberdade. Nessa altura, como tem mostrado a experiência, mesmo que se faça todo o esforço por modificar determinada tendência, tudo é absolutamente inútil. Poderá, talvez, melhorar um pouco e regressará à sua condição habitual e a seus modos costumeiros. Portanto, é na primeira infância que um firme alicerce deve ser estabelecido. Enquanto o ramo está verde e tenro pode ser facilmente endireitado.”
Educação Bahá'í, uma compilação, p. 39.

A responsabilidade de educar as crianças
"Nós prescrevemos para todos os homens aquilo que conduzirá à exaltação da palavra de Deus entre Seus servos e, também, ao progresso do mundo da existência e à elevação das almas. Para este fim, o maior meio é a educação da criança. A esta, cada um e todos devem apegar-se com firmeza. Nós, verdadeiramente, conferimos a vós esta incumbência em numerosas epístolas assim como em Meu Mais Sagrado Livro. Feliz aquele que a ela presta obediência."
Educação Bahá'í, uma compilação, p. 14 e 15.

O propósito da educação bahá’í
"Num tempo futuro, a moralidade degenerará a um grau extremo. É essencial que as crianças sejam criadas na conduta bahá'í para que encontrem a felicidade tanto neste mundo como no vindouro. Se assim não for, ver-se-ão cercados de tristezas e dificuldades, pois a felicidade humana está alicerçada no comportamento espiritual."
Educação Bahá'í, uma compilação, p. 41.

Educar espiritualmente…
“Os filhos se assemelham aos ramos tenros e verdes; crescem do modo como vós os educais.”
‘Abdu’-Bahá

"A instrução dessas crianças é assim como o trabalho de um jardineiro afectuoso que cuida de suas pequenas plantas nos campos floridos do Todo-Glorioso. Não há dúvida de que produzirá os resultados desejados; isto é especialmente verdade no que se refere à instrução das obrigações e da conduta bahá'í, pois as pequenas crianças devem ser conscientizadas, no coração e na alma, que Bahá'í não é apenas um nome, mas uma verdade. Toda a criança tem de ser instruída nas coisas do espírito para que venha a personificar todas as virtudes e tornar-se uma fonte de glória para a Causa de Deus. De outra forma, a mera palavra Bahá'í, se não produzir frutos, perderá o seu significado. Esforçai-vos, pois, com o melhor de vossa habilidade, para que estas crianças saibam que um bahá'í é aquele que personifica todas as perfeições, que ele tem de irradiar luz como um castiçal aceso…"
Educação Bahá'í, uma compilação, p. 42.

A importância do educador espiritual
"Abençoado é o professor que se mantém fiel ao Convénio de Deus e se ocupa com a educação das crianças. Para ele, a Pena Suprema dedicou aquela recompensa que está revelada no Mais Sagrado Livro. Abençoado, abençoado é ele!"
Educação Bahá'í, uma compilação, p. 21.
"Se não houvesse educadores, todas as almas permaneceriam selvagens e, se não fosse o mestre, as crianças seriam criaturas ignorantes."
Educação Bahá'í, uma compilação, p. 40.
"Ó tu, professor das crianças do Reino!
Tu te levantaste para realizar um serviço que, com justiça, te permitiria glorificar-te acima de todos os professores da Terra. Pois os professores deste mundo fazem uso da educação humana para desenvolver os poderes da humanidade, sejam eles espirituais ou materiais, enquanto que tu estás instruindo estas jovens plantas nos jardins de Deus de acordo com a educação celestial, e lhes estás transmitindo as lições do Reino (...) Apega-te, com firmeza, a essa espécie de ensino, pois os seus frutos serão muito grandes..."
Educação Bahá'í, uma compilação, p. 52. 

Importância da Educação Moral das Crianças e dos Pré-Jovens

Texto de 'Abdu'l-Bahá (1844-1912):
“A educação e a instrução das crianças está entre os actos mais meritórios da humanidade, e atrai a graça e o favor do Todo-Misericordioso, pois a educação é a base indispensável de toda a
excelência humana e permite ao homem ascender às alturas da glória eterna. Se uma criança for treinada desde a infância, ela, através do amoroso cuidado do Santo Jardineiro, sorverá as águas cristalinas do espírito e do conhecimento, assim como árvore jovem no meio de regatos que correm mansamente. Ela, seguramente, atrairá a si os brilhantes raios do Sol da Verdade e, por meio da luz e do calor recebidos, crescerá sempre viçosa e bela no jardim da vida. Por esse motivo, o mentor deve ser também médico; isto é, ao instruir a criança, deve remediar-lhe os defeitos; deve dar-lhe conhecimento e, ao mesmo tempo, criála de modo que adquira natureza espiritual. Que o professor seja um médico para o caráter da criança, de modo que possa curar os males espirituais dos filhos dos homens. Se nesta momentosa tarefa for dispendido esforço vigoroso, o mundo humano resplandecerá com outros adornos e irradiará a mais bela-luz. Então este lugar sombrio tornar-se-á brilhante, e esta morada de terra há-de converter-se no Céu. Os próprios demónios, então, se transformarão em anjos; os lobos, em pastores de rebanhos; as matilhas de cães selvagens, em gazelas que pastam nas planícies da unidade; as bestas ferozes, em pacíficos rebanhos; as aves de rapina, com garras afiadas como navalham, em aves canoras que chilreiam os seus melodiosos cantos.
Pois a realidade íntima do homem é a linha de demarcação entre a sombra e a luz, é um lugar onde os dois mares se encontram; é o ponto mais baixo da descida do arco e, por esse motivo, é capaz de atingir todos os graus superiores. Com educação, pode alcançar toda a excelência; sem educação, estagnará no ponto mais baixo da imperfeição.
Toda a criança é potencialmente a luz do mundo e – ao mesmo tempo – as suas trevas; por isso a questão da educação precisa de ser considerada como da máxima importância. Desde a infância, a criança tem de ser nutrida no seio do amor de Deus e criada nos braços de Seu conhecimento, para que irradie luz, cresça em
espiritualidade, encha-se de sabedoria e erudição, e seja adornada com as características da hoste angelical...”
'Abdu'l-Bahá (1844-1912), Selecção dos Escritos de 'Abdu'l-Bahá
Educar espiritualmente...

Ó Deus! 
Educa estas crianças.
São as plantas do Teu pomar, as flores do Teu prado, as rosas do Teu jardim.
Permite que sobre elas caía a Tua chuva e brilhe o Sol da Realidade com o Teu amor.
Que a Tua brisa as refresque, para que sejam treinadas, cresçam e se desenvolvam, e manifestem a maior beleza.
És o Generoso! És o Compassivo!
'Abdu'l-Bahá

domingo, 1 de agosto de 2010

"Volve tua face para a Minha e renuncia a tudo menos a Mim; pois Minha soberania dura e Meu domínio não perece. Se buscares a outro senão a Mim, ainda que procures no universo para todo o sempre, em vão será tua busca."

Palavras ocultas de Bahá'u'llah

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Formação de Valores - Uma entrevista com David Isaacs

Por Maite Armendáriz Azcárate
Em cada idade sua virtude
O fim da educação é a felicidade, embora às vezes nos esqueçamos disso, é o que diz o especialista mundial David Issacs, autor do livro "A educação das virtudes humanas". A universidade chilena 'Andrés Belo' o convidou para promover um seminário para docentes e diretores de escolas, em junho de 2002, onde foi realizada a seguinte entrevista.
Consultor em centros educativos de mais de trinta países europeus, africanos e americanos, David Isaacs recebe convites até da Finlândia para proferir conferências.
Sua obra mais conhecida é sem dúvida "A educação das virtudes humanas", que já está em sua 13ª edição. Somam-se a isso uma série de vídeos em que aborda este mesmo tema, fundamental na hora de educar para este homem casado, pai de sete filhos.
David Isaacs dirigiu por cerca de uma década o Instituto de Ciências da Educação da Universidade de Navarra, Espanha, e durante outro tanto foi vice reitor. Na atualidade é professor da Organização e Gestão de Centros Educativos da faculdade de Filosofia e Letras dessa universidade, e é professor colaborador do Instituto de Ciências para a Família.
No seminário organizado pela Universidade de Andrés Bello, o perito se referiu aos elementos indispensáveis na gestão eficaz de centros educativos. A concorrida platéia escutou atentamente suas idéias sobre o assessoramento pessoal dos estudantes, a educação da laboriosidade e dos hábitos de estudos, a prudência e os meios de comunicação de massa, entre outros temas de interesse.
Por que o senhor está convencido da necessidade de se aprofundar e divulgar a educação das virtudes humanas?
Virtudes humanas são hábitos operativos bons. Por exemplo: a sinceridade, a solidariedade, a compreensão, a perseverança, a lealdade ou a responsabilidade. É possível pensar que, como conseqüência do processo educativo, os jovens devem ter aprendido a ser profissionais competentes, cidadãos responsáveis, amigos leais, membros responsáveis de uma família e - para os crentes - filhos responsáveis de Deus. Como pode uma pessoa ser um profissional competente sem ser ordeiro, responsável ou perseverante? E ser um cidadão responsável, sem ser honrado, solidário ou justo? Ser amigo leal sem ser sincero e compreensivo? Ou membro responsável de uma família, sem ser generoso e flexível? Seria raro encontrar um filho de Deus responsável que não tenha tentado desenvolver-se em virtudes humanas. Além disso, mediante o desenvolvimento das virtudes se alcança uma maior maturidade pessoal. E o resultado deste esforço é a autêntica felicidade. Parece que existem razões de sobra para insistir na importância das virtudes.
De que maneira e desde que idade se consegue educar primeiro em hábitos e logo conseguir que estes se tornem virtudes ou valores nas crianças e adolescentes?
As virtudes, sendo hábitos, começam a desenvolver-se desde que nasce a criança. Contudo, desenvolve-se uma virtude conforme a amplitude e a intensidade com que se a vive e também de acordo com a retitude dos motivos ao viver essa virtude. Portanto, de forma restrita, as crianças não podem desenvolver virtudes, como tal, até os sete ou oito anos, quando então chegam a ser consciente de seus atos. Em troca, antes, pode-se prepará-las para este momento insistindo no desenvolvimento de hábitos, ainda que as crianças não entendam muito bem o porque dos mesmos. Com as crianças pequenas temos que insistir muito em fazer - e que façam coisas -. Estas ações se traduzirão em hábitos. Paulatinamente, deve-se passar a exigir-lhes mais no pensar, para que pensem antes de tomar suas próprias decisões.
Escolas autônomas
Para um professor de química ou inglês, que deve ensinar um extenso programa num curso com 40 alunos, é possível educar os alunos também em valores?
Sim, porque se educa em primeiro lugar com o exemplo. O professor às vezes crê que não poderá educar os estudantes em virtudes porque ele é o primeiro a não vivê-las plenamente. Porém, não é o exemplo perfeito o que educa, mas o exemplo de luta para se superar, para tentar cumprir bem, é que será notado pelos alunos. E isto é o que lhes interessa, porque é atrativo. Se um professor vive sua profissão com alegria, cuidando das diferentes virtudes em sua vida, contagiará os alunos.
Isaacs lembra que um colégio não é unicamente a soma de várias salas de aula soltas.
Um centro educativo que quer promover o desenvolvimento das virtudes humanas também deverá pensar em ter algumas atividades onde os alunos possam ir descobrindo e conhecendo as virtudes intelectualmente. E fará falta, assim mesmo, um conjunto de atividades onde o aluno possa viver as virtudes com os demais.
Que elementos o senhor considera básicos para que se possa dirigir um colégio hoje em dia?
Entendo que a riqueza de um centro educativo está na soma dos estilos pessoais de seus membros, contanto que compartilhem os mesmos valores. Se não for assim, haveria anarquia. Para tanto, um bom diretor se ocupará principalmente de promover projetos de melhora e de atender as pessoas, com o fim de assegurar que cada colaborador tenha um plano personalizado de aperfeiçoamento. Lamentavelmente, este planejamento está distante de muitas das administrações educativas que acreditam que apenas basta regulamentar tudo ao máximo.
Em seguida David Isaacs recorda as palavras de Ruiz, um autor espanhol:
"Os mestres são obedientes. As autoridades educativas sempre tiveram conhecimento desta circunstância e a têm usado a seu favor até os limites do abuso". Atualmente, na Espanha, esse veículo é o chamado desenho curricular básico que, de fato, anula em grande parte a autonomia do professor. No Reino Unido cada colégio está obrigado a adotar um 'sistema de gerenciamento de desempenho', isto é, um sistema para medir a eficácia da gestão. Com o fim de desculpar a adoção dessa obrigação de duvidosa utilidade, escrevem-se livros que pretendem mostrar como se pode aproveitar positivamente essas imposições do momento.
Então, em resumo, o centro educativo não pode ser uma organização rígida?
Pelo contrário: sobre a base de uma organização básica, deve-se promover o desenvolvimento pessoal e intransferível de cada um de seus membros. Quanto menos se confia nos funcionários, nos professores e nos diretores dos colégios, mais trâmites burocráticos são criados e mais fiscalizações são introduzidas.
Família: amor incondicional
O senhor está convencido da necessidade de se "educar para o amor". De que maneira é necessário viver hoje, no interior dos lares, para se ter bons alunos em matéria de afeição?
Na família a pessoa pode e deve ser aceita pelo que é, por se única. Não tanto pelo que faz, mas sim pelo que é, pelo conjunto dos aspectos de sua intimidade. Hoje em dia os pais tendem a gastar seus esforços em conseguir que seus filhos aprendam a fazer mais coisas, aprendam mais idiomas, pratiquem mais esportes, desenvolvam diversos gostos, e se esquecem da necessidade de criar esse clima de aceitação incondicional onde cada pessoa pode expressar-se sabendo que não vai ser julgado ou rotulado. Amar, disse o filósofo alemão Josef Pieper, é dizer ao outro 'que bom que você existe'. Na família precisamos buscar o que há de positivo nos outros, e dizer-lhes o temos encontrado. Trata-se de ajudar cada um para que utilize o que possui da melhor maneira possível. Somente neste contexto é possível entender bem a idéia de uma educação sexual voltada para o amor.
Em seus livros o senhor também insiste na dinâmica da comunicação dentro do matrimônio?
Na vida, constantemente temos que tomar decisões. Se uma decisão foi a de casar-se, deve-se atuar coerentemente com isso. A prioridade para o homem casado deve ser a sua esposa e vice-versa. A seguir os filhos, e a seguir os demais É evidente que não se trata de ser simplista, mas a verdade é que muitas pessoas deixam de ser conscientes de suas prioridades devido à vida de ação frenética incessante que levam. A palavra 'comunicação' vem da palavra 'comunidade' que, por sua vez, vem de 'unidade'. Como podemos conseguir a unidade? Compartilhando valores. Como podemos manter a unidade? Comunicando-nos, fazendo coisas juntos e tendo projetos de futuro comuns.
Quanto influi a boa comunicação dos pais nos cuidados e na projeção dos filhos?
O exemplo dos pais é vital. De fato, na educação existem dois princípios que tem vigência sempre: A exemplariedade e a personalização. Os educadores temos que dar o exemplo lutando sempre para melhorarmos como pessoas e, por sua vez, tratar cada filho ou cada aluno como sendo uma pessoa única, irrepetível.

Publicado no Diario El Mercurio
Traduzido por René Bernardes para o Portal da Família

Fonte : Portal da Familia http://www.portaldafamilia.org

domingo, 30 de maio de 2010

POR QUE ENSINAR VALORES?

Valores

(Celso Antunes)


Dizer a uma criança de cinco anos para que coma salada, porque salada “faz bem” não a induz a devorá-la. Se o fizer, fará para agradar a mãe ou, pior ainda, comerá salada “apesar de detestá-la”, porque ainda que não ouse revelar, tem medo da mãe. A criança não gosta das saladas não porque a química que compõe seu organismo a rejeita, mas sim porque não compreende porque deve comer salada. As palavras da mãe não garantem a convicção e em seu nível de conhecimento, comer salada não faz qualquer sentido, ao contrário, por exemplo, de entupir-se de guloseimas. Em verdade, quem recusa a salada na criança não são as suas células gustativas que caracterizam o paladar, mas seu cérebro, pois o cérebro humano jamais aceita o que não lhe faz pleno sentido.
A referência à salada e a circunstância da criança são apenas exemplos simbólicos. Em qualquer idade, somente gostamos do que possui sentido e por esse motivo não somos capazes de decorar um punhado de palavras esdrúxulas, como por exemplo, “murufratagitrari, brucutrape, saratripiu”, mas guardamos com carinho o recado gostoso de que “amanhã será domingo de sol e a praia nos espera”. Se pensarmos bem, a aparente dificuldade da memória para registrar os dois recados acima é absolutamente a mesma, mas fixamos a segunda e não a primeira porque a segunda faz sentido. Em síntese, o “combustível” do cérebro humano é sempre a “significação” e quando tentam nos enfiar na memória frases sem essa essência, reagimos como reage a criança diante da salada imposta.
É por esse motivo que é importante ensinar valores.
Os valores não são como habitualmente se pensa atributos desejáveis ao ser humano, ou fundamentos da dignidade da pessoa, ou objeto de escolhas morais, ou qualidade que pode fazê-lo mais ou menos bonito no contexto social. Ao contrário, os valores são os alicerces da humanidade, a essência da preservação da espécie e o “alimento” que integra e faz prosperar os grupos sociais. Mais que isso, “Valores” são, em última instância, aquilo que pode ser vivenciado como algo que faz sentido e, dessa forma, como tudo quanto dá razão à vida. A vida biológica do homem, tal como a vida biológica da mosca, não necessita ser vivida. Representa simplesmente uma circunstância evolutiva, um acidente orgânico e dessa forma, basta durar apenas o tempo para se reproduzir. Com essa missão orgânica concluída, a vida não tem mais motivo e morrer ou não constitui apenas um acidente que termina outro que a gerou.
Mas, o homem não é apenas constituído por uma vida biológica. É uma vida que alcança a plenitude do sentido porque ama, sofre, constrói, se zanga, se surpreende, foge da tristeza, anseia pela felicidade, cultiva a simpatia, exibe compaixão, embaraça-se, assusta-se com a culpa, cresce com o orgulho, mortifica-se com a inveja e por isso tudo causa espanto e admiração, indignação ou desprezo. “Sem sentir-se “inundado” pelas emoções e pelos valores, a vida não é vida e se fosse possível não tê-los, bastava ao homem passar pela vida e não viver”.
É por esse motivo, insistimos que é importante ensinar valores.
Mas se não se duvida dessa importância, é essencial que se descubra que ensinar valores tal como se insiste com a criança que coma salada, implica em sua rejeição ou, pior ainda, em um domínio sem compreensão, uma aprendizagem sem significação, logo rejeitada pelo cérebro. Valores não se ensinam, pois, com conselhos.
Nada contra os conselhos. Se bonitos e bem intencionados até que não ficam mal em quem quer que seja. Mas, acredita-se que possam ser “apreendidos” representa uma outra história. Os valores, tal como as saladas, precisam de momentos certos para serem mostrados e, sobretudo, necessitam de exemplos para serem explorados, circunstâncias específicas para que sejam compreendidos, ambientes emocionalmente preparados para que sejam discutidos. Assim como não se discute a boa intenção da mãe em tentar empanturrar seu filho de cinco anos de saladas, também não se discute a intencionalidade de se ensinar valores de forma discursiva. Isso até pode ser satisfatório para a consciência de quem transmite, mas certamente é inútil para o cérebro de quem acolhe. Se é que acolhe.
Fonte:Celso Antunes

quarta-feira, 24 de março de 2010

Matéria na revista Carta Capital sobre a Fé Bahá'í, com enfoque no trabalho educacional

A Carta Capital desta semana traz uma matéria sobre a Fé Bahá'í, com enfoque no trabalho educacional realizado pela Associação Monte Carmelo, em Porto Feliz, SP.  Por coincidência, esta edição está disponível em formato digital, gratuitamente, até o dia 27 de abril.  Vejam no link abaixo.  A materia está na página 10-11.
Boa leitura!

domingo, 14 de março de 2010

EDUCAÇÃO e PAZ MUNDIAL


Na busca de meios eficientes para estabelecer e manter a paz, a educação tem sido muito subestimada e, conseqüentemente, pouco utilizada. Na verdade, é tão somente a distância de um fio de cabelo que hoje separa a humanidade de um holocausto atômico que alertou os povos em geral ao engano terrível que foi cometido, deixando de educar as últimas três gerações para uma finalidade de paz e compreensão, em vez da guerra e agressão. Desta forma, por uma necessidade imperiosa, a educação para a paz está a ser lentamente implantada nos currículos das escolas primárias e secundárias, e também em algumas universidades do mundo. A Educação para a paz pode ser vista não somente como uma arma poderosa na batalha contra o desastre iminente, como também, e mais importante ainda, como a maior força para que possamos manter a paz, uma vez estabelecida. Até à presente data, a maioria das pessoas simplesmente jamais recebeu educação material, social ou espiritual com vista à construção de um mundo de paz. Os nossos brinquedos, livros e materiais didático, os nossos heróis e modelos de vida são valorizados pela sua força e não pela sua compaixão, pelo seu machismo e não pela sua humanidade, pelo seu valor de mercado e não pela contribuição que podem trazer à felicidade e desenvolvimento de uma coletividade. As pesquisas mostram que muitos de nós, seres humanos, nem conseguimos imaginar como seria um mundo de paz, as nossas cabeças estão cheias de imagens de conflito, temor e guerras.
Na primeira década deste século, ´Abdu´l-Bahá, o filho de Bahá´u´lláh, falou, durante suas viagens ao Ocidente, que a paz universal era o maior problema enfrentado pela humanidade e que cada indivíduo deve combater até os pensamentos de guerra.
"Hoje o problema mais importante nos assuntos do mundo da humanidade é a questão da paz universal, que é o maior meio de contribuir à própria vida e felicidade da humanidade. Sem essa realidade mais luminosa, é impossível que a humanidade atinja o conforto real e a proficiência. Antes, sofrerá, cada dia, alguma desavença e tragédia..."
Abdu´l-Bahá
Ele também indicou como devemos educar as crianças, no que diz respeito à paz:"Semeia nas mentes malháveis das crianças as sementes da paz, ensina-lhes as vitórias da paz. Cerca-as com lições de paz. Envolve as com a atmosfera da paz e inspira seus corações com as realizações da paz. Permite que seu alimento seja a paz, sua contemplação a paz, sua aspiração máxima a paz e o propósito movedor de suas vidas a paz.”
Abdu´l-Bahá


Alguns Princípios Sociais Bahá'is.
Bahá´u´lláh e ´Abdu´l-Bahá destacam diversos princípios sociais com referência específica à realização e manutenção da paz mundial. Entre eles, os seguintes:
Perspectiva mundial Eliminação das guerras e redução de armamentos Participação plena das mulheres na sociedade Eliminação dos preconceitos raciais, regionais, nacionais e religiosos Idioma auxiliar universal Paz entre os indivíduos.
As pessoas podem ser educadas para serem mais cooperativas, tomarem decisões morais mais elevadas, valorizarem e apreciarem culturas e povos diferentes do seu, diminuírem o número de conflitos e adquirirem uma perspectiva mundial, em vez de permanecerem limitadas às visões locais, regionais ou nacionais.
Uma visão real do mundo físico é uma imagem nova para a humanidade. As fotografias do planeta Terra, tiradas do espaço, retratam o nosso globo verde e azul, sem nenhuma fronteira ou divisão artificial. A nossa perspectiva socioeconômica também deve espelhar este grau de unidade. O ex-astronauta Edgar Mitchell explica-nos o efeito desta visão global, nas seguintes palavras:
"Nenhum homem que eu conheça, foi até à lua e voltou sem ter sido afetado de uma maneira muito semelhante. É o que eu prefiro chamar de consciência global instantânea. Cada homem volta com um sentimento que ele não é apenas um cidadão norte-americano; ele é um cidadão planetário. Ele não gosta da forma que as coisas estão, e quer melhorar a situação..."
Um estudo dos mapas, documentos históricos e representações da terra, apresentam uma visão cada vez mais ampla e exata do globo terrestre. As crianças também têm uma visão do mundo que se forma gradativamente. Mas através dos meios de comunicação em massa, em poucos anos a sua visão do mundo físico completa-se. Entre os 7 e 9 anos de idade também a visão social é alcançada. Até ao final da sua adolescência as crianças já criaram um forte conceito de "nós" e os "outros". Elas fixam sua identidade racial, étnica e nacional. Se os modelos e conceitos que lhes são apresentados forem limitados e restritos, a sua visão também o será. Mas se os modelos e conceitos forem ampliados e abrangentes, da mesma forma será também o seu modo de pensar. Para nutrir o desenvolvimento da perspectiva global, desde o início a criança deve ter múltiplos contactos com pessoas das mais diversas raças e nacionalidades.
Bem cedo deve a criança perceber a beleza e unidade que existem na família humana, pois a falta deste reconhecimento, ou seja, os pensamentos e comportamentos preconceituosos, é uma das principais causas das guerras.
Os pais devem escolher os brinquedos e a literatura infantil que reflitam a beleza e a diversidade da raça humana, e que despertem nas crianças sentimentos universalistas. Ao ver outro país na televisão, ou ao encontrar-se com pessoas provenientes de outros países, os adultos devem manifestar de viva voz seu prazer por isso, mostrando, também, um amplo espírito hospitaleiro. Assim começa a educação universal

"Que não se vanglorie quem ama o seu próprio país, mas quem ama o mundo inteiro. A terra é um só país e a humanidade os seus cidadãos."
Bahá'u'lláh

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

MODELO ATUAL DE EDUCAÇÃO PARA NOSSOS FILHOS

 

O tema propõe a existência de um modelo de educação apropriado aos tempos atuais. A primeira pergunta que se coloca é: como se caracterizam os tempos atuais? Os tempos atuais comparados aos tempos passados, talvez mais se caracterizem pela liberdade. A busca da liberdade, a busca do rompimento dos limites, que até então, de certa forma corretamente, foram vistos como cerceadores da liberdade, fatores muito limitantes do crescimento humano.

Mas o que é a verdadeira liberdade? Se a nossa busca pela liberdade é o que caracteriza os tempos atuais, se é a vivência de uma plenitude sem um limitante qualquer, o que é a verdadeira liberdade? Poderíamos considerar a experiência com o trânsito aqui em Brasília que é um exemplo interessante. Aparentemente tolheram a nossa liberdade colocando os "pardais" por todos os cantos da cidade. Mas podemos nos sentir muito mais livres sabendo que obedecemos à lei, que obedecemos a determinados parâmetros que dão mais segurança, do que uma liberdade que permitiria a um louco qualquer andar a 120, 130, 140 km/h, e que poderia, a qualquer momento, tirar a vida e a liberdade e muita coisa preciosa de muita gente em nome daquilo que chamaríamos liberdade. As regras do trânsito são um bom exemplo do que é limite de liberdade. É melhor ter sinais de trânsito ou não ter sinais de trânsito? Me parece que somos muito mais livres quando obedecemos a sinais de trânsito, quando tenho sinal verde ou vermelho, quando tenho faixas, placas, aonde posso criar um ambiente de convívio muito mais harmonioso. Confiança e tranqüilidade: me parece que a existência de leis não estão em oposição a um pensamento de liberdade.

A partir deste exemplo da vida prática do dia-a-dia no trânsito, podemos inferir alguma coisa que a experiência religiosa, a vivência religiosa e a mensagem religiosa trazem há milênios: Que a verdadeira liberdade consiste na observação de leis, preceitos e princípios. Na realidade, tudo aquilo que a religião nos trouxe foi sempre para nos trazer a felicidade. Todas as religiões sempre visaram trazer a verdadeira liberdade através de um processo de auto-conhecimento, através do entendimento da nossa natureza e através desse entendimento, deste conhecimento, nos deram os parâmetros necessários para que possamos viver bem neste dia, com todas as características que este mundo tem. 

A busca desta experiência de nos adequarmos à nossa verdadeira natureza, entendermos a nossa verdadeira natureza, é um elemento essencial do processo de educação. Existe um modelo de educação adequado aos tempos atuais? Sim, existe, e este modelo deve necessariamente obedecer a certos parâmetros e princípios, a certas regras que dizem respeito à real natureza do ser humano. Se a nossa real natureza não é meramente material e física e sim espiritual, há então um caminho, há uma chave, há uma solução para diferentes desafios da humanidade. Se a real natureza do ser humano é espiritual, então a chave destes princípios, a chave destes elementos que vão dar norteamento a este processo ou a esta visão de educação, se encontram na religião.

Bahá'u'lláh em um de Seus escritos, diz o seguinte:

"Considerai o homem como uma mina rica em jóias de inestimável valor. A educação tão somente pode faze-la revelar os seus tesouros e habilitar a humanidade a tirar dela algum benefício."

Se nós somos uma mina rica em jóias de inestimável valor, a primeira coisa que devemos considerar em termos de educação é que cada ser humano tem um potencial inerente. Uma mina já tem o seu potencial, ela não cria mais, não se incrustam numa mina mais tesouros. Ela é o que é: tem uma capacidade natural de oferecer-nos algum benefício. Então, a educação deve considerar cada ser humano como tendo um potencial e algo deve ser feito para revelar este potencial. Ou seja, todos nós temos este potencial, todos nós somos dotados de uma capacidade, de uma riqueza natural e a educação é que deve fazer esta riqueza aflorar. 

Por educação não me refiro só à educação formal. Existem várias espécies de educação: a educação formal e informal, a educação material, a humana e a espiritual, enfim vários elementos do processo de educação que podemos nos referir. Mas quero me concentrar mais na questão da educação como sendo o elemento de conexão entre pais e filhos e como esta conexão é na realidade um processo educativo que normalmente não é visto como tal.

Hoje em dia, infelizmente, nós pais temos uma certa tendência de querer colocar nas mãos da escola o processo de educação dos nossos filhos: "eu trabalho o dia inteiro, tenho muitos afazeres, tenho mais o que fazer na vida, não tenho tempo, não tenho informação, não tenho instrução nesta área, então a escola deve educar o meu filho". Na realidade é esta conexão entre pai e filho que cria a verdadeiro elemento extrator das potencialidades daquela mina. Temos esta missão inicial de oferecer à escola a mina de certa forma já desvendada, dar o mapa da mina e dizer: olha esta é a vida que eu estou lhe entregando, aí estão os tesouros desta mina, agora ajude a lapidar isto, ajude a extrair, a revelar e colocar mais luz sobre estes tesouros. Então, no objetivo da educação como esta conexão entre pais e filhos, estamos buscando um novo modelo, que deve ser o de revelar as perfeições interiores e exteriores que cada criança, adolescente ou jovem tem. 

Este aspecto do objetivo da educação como sendo o de revelar estas perfeições interiores se expressa no seguinte texto de Abdu'l-Bahá:

"Empregai toda a energia para adquirirdes tanto perfeições interiores quanto exteriores, pois o fruto da árvore humana tem sempre sido, e sempre será perfeições internas e externas. O fruto da árvore humana, o resultado da nossa existência é a revelação destas perfeições internas e externas. Não é desejável que um homem seja deixado sem conhecimentos ou habilidades pois será então nada mais do que uma árvore estéril. Assim tanto quanto o permitam vossa capacidade e aptidão deveis adornar a árvore do ser com frutos tais como a sabedoria, o conhecimento, a perfeição espiritual e a fala eloqüente."

Quero me concentrar na perfeição espiritual. A nossa função no processo de educação, na conexão com nossos filhos, deve ser o de exatamente fazer com que eles apresentem frutos em sua existência como sabedoria, conhecimento e percepção espiritual, porque um ser humano que não seja consciente da sua realidade interior, afinal quem será? Em uma Palavra Oculta, Bahá'u'lláh diz: "examina-te a ti mesmo a cada dia pois a morte sem prenúncio poderá te sobrevir e serás instado a prestar contas". Se não conheço a mim mesmo, se não me analiso a cada dia, se não tenho percepção da minha própria realidade, quem sou? Para que sirvo? Só para trabalhar, criar família, perpetuar meu nome? É muito pouco para uma criação tão complexa. É muito pouco nos apegarmos simplesmente à nossa realidade exterior! Os pais vão oferecer à existência humana uma nova criatura, mas uma criatura com percepção espiritual, consciente de sua própria realidade. 

Para que falemos em percepção espiritual devemos reconhecer que esta relação e este modelo de educação, este modelo que dá vida - pois a educação é muito dar vida real a uma criatura, não só a física mas sim a vida na sua plenitude - tem que ter como base a crença e o reconhecimento de algo superior, de algo divino. Ou seja, se eu educar os meus filhos em sabedoria, em conhecimento, em fala eloqüente, se eu colocar eles nas melhores escolas, se eles tiverem acesso ao que há de mais moderno em educação, em treinamento, em informação, e deixo de dar a eles capacidade para esta percepção espiritual, esta compreensão que há algo superior a eles e que existe Alguém que nos deu vida, que trouxe a criação à existência, se eu não baseio este processo no reconhecimento do divino, o processo estaria falho. 

A razão pela qual necessitamos verdadeiramente do reconhecimento do divino, é que sua falta resulta na perda dos valores éticos e morais essenciais à sobrevivência humana. É a própria degradação do ser humano e a negação de sua essência espiritual. O fato de em Brasília terem incendiado um ser humano porque alguns jovens irresponsáveis acharam que poderiam pregar nele uma peça, não reflete somente a perda dos valores éticos e morais mas na realidade reflete a perda do reconhecimento de algo superior, do reconhecimento do divino, a perda do reconhecimento que somos pequenos face à esta existência maior, que é o nosso Criador, face à existência maior que é a própria criação. A perda desta humildade, que não vejo só como um valor moral ou ético mas sim como um valor espiritual, é que está levando às conseqüências do que estamos vivendo. Em um texto sobre a questão da educação, Bahá'u'lláh fala sobre a importância do reconhecimento do divino e da crença no divino dentro deste processo do despertar humano, dentro do processo de educação. Ele diz o seguinte: 

"O que é de suprema importância para as crianças, o que deve preceder a tudo o mais é ensinar-lhes a unidade de Deus e as leis de Deus, pois sem isto não se pode incutir o temor a Deus e sem o temor a Deus surgirão uma infinidade de ações odiosas e abomináveis e serão manifestados sentimentos que transgredirão todos os limites."

Em outro de seus textos, Bahá'u'lláh fala que o ideal seria que nós só conhecêssemos o amor e não o temor. Mas só conhecer o amor exige um grau de evolução espiritual tão grande que o homem ainda não atingiu e daí então a necessidade do conceito de temor. O que é temor? Não é medo. Não temos que ter medo de Deus; não é por medo de punição nem pela esperança de recompensa que eu devo fazer alguma coisa; não é pela expectativa de recompensa pelos meus atos, não é pela esperança do paraíso nem pelo medo do inferno, da punição ou do que quer que seja, que eu devo agir. Então, temor não é medo, mas o receio profundo de desagradar àquele que você ama muito. É o medo da perda do amor: o quão horrível é eu perder o amor de quem eu tanto amo, de quem me deu vida. O receio de perder este amor, o receio deste distanciamento é temor. O temor é o grande freio que precisamos. Se tivéssemos a noção da plenitude do amor, este é tão mais amplo e tão mais profundo que tomados pelo amor nem me passa pela cabeça realizar qualquer ato que desagrade ao nosso Bem-Amado, o objeto do nosso amor. Assim estamos envoltos em um mar de amor. Mas como somos humanos, falhos, falíveis, como erramos, isto faz parte do nosso processo de aprendizado e foi assim que Deus nos criou, falíveis, imperfeitos, mas capazes de almejar e trabalhar rumo a uma perfeição.

Outro dia estava lendo um texto que me tocou muito, onde um psicólogo falava acerca desta síndrome que às vezes temos de sermos o herói, o perfeito, o melhor. Ele falava: que ruim ser o primeiro lugar, você não tem mais nada para galgar, enquanto que o segundo lugar sempre tem ainda espaço para ser um pouco melhor. Acho que se nós tivéssemos nascido perfeitos, se Deus nos tivesse criado à sua imagem e semelhança no que tange à perfeição, que motivação teríamos para fazer qualquer coisa? Rumar em direção a que? Não teríamos nada que nos motivasse. 

Voltando à questão do temor, a nossa imperfeição nos leva a um sentimento de busca de sempre querer agradar àquele que nos é superior, demonstrar o nosso reconhecimento, demonstrar o nosso amor, e o medo da perda deste amor é que nos motiva a não transgredir determinados limites. Mas, se eu não conheço este ser superior e não conheço este amor, que receio teria em transgredir limites? É quando Bahá'u'lláh continua e diz: "os pais devem envidar todos os esforços para levar seus filhos a serem religiosos". Não no sentido da religiosidade dogmática em que obedeço a certos rituais e dogmas e nem entendo muito bem o que estou fazendo. Mas religioso no sentido da ação diária da religião ser o reflexo da minha vida diária e da minha vida diária ser um reflexo da minha religião. Diz Bahá'u'lláh: "Os pais devem envidar todos os seus esforços para levar os seus filhos a serem religiosos, pois, se as crianças não atingirem este que é o maior de todos os ornamentos da vida humana, não obedecerão a seus pais, o que, de certo modo, significa que não obedecerão a Deus. Com efeito, tais crianças não terão consideração por ninguém e farão exatamente o que lhes aprouver."

Aí vem a velha pergunta: "Onde foi que eu errei? O que foi que eu fiz que meu filho não me obedece, virou uma bagunça aqui em casa, cada um faz o que quer, não existe regra, não existe ordem, mas eu sempre fui durão, eu sempre impus lei e ordem. Ele tinha hora para chegar em casa, hora para estudar e, de repente, eu perdi o controle de tudo." Na realidade, você nunca teve o controle sobre nada, porque na realidade nunca houve qualquer noção do que significa obediência, se você não mostrou a seu filho desde pequeno o reconhecimento de que nós somos pequenos, de que somos insignificantes perante a criação, perante Deus. E é o que estamos vendo hoje em dia. Hoje crianças de 2, 3 anos de idade, fazem o que lhes apraz e isto é uma grande verdade. Há crianças hoje que são tão tiranas e os pais ficam absolutamente perdidos, não sabem o que fazer. Na realidade, esta é uma questão de conexão espiritual entre pais e filhos, conexão que poderíamos chamar da educação que dá a vida, que dá sentido, que dá propósito à criança.

Então, na relação dos pais para os filhos, teríamos muitos aspectos e elementos a analisar. O primeiro é a questão do exemplo. Não há melhor forma de educação, melhor processo de se transmitir o que quer que seja do que o exemplo. E isto é uma coisa que merece uma atenção mais aprofundada. O segundo aspecto é a consulta e o diálogo. Se nós reconhecermos em nossos filhos "minas ricas em jóias de inestimável valor", devemos prestar uma atenção muito grande ao que esta mina tem a nos oferecer e dar reconhecimento ao que ela diz, em proveito do seu crescimento, Para interagir com esta mina rica em jóias temos que saber como extrair estas jóias e isto se dá através do exemplo. Não vejo método melhor, mais eficiente, mais coerente, mais adequado do que o próprio exemplo. Este diálogo e este exemplo criam um canal de educação entre pais e filhos que leva ao que poderíamos chamar de uma família que tem um potencial de prosperidade muito grande. Em um dos Seus escritos Abdu'l-Bahá diz:

"Notai, quão facilmente, quando existe unidade em uma dada família, os assuntos desta família são conduzidos; que progresso os membros desta família fazem, como prosperam no mundo. Seus assuntos estão em ordem, desfrutam de conforto e tranqüilidade, têm segurança, sua posição está assegurada, vêm a ser invejados por todos. Tal família, à medida em que os dias se sucedem só crescem em posição e duradoura honra."

Unidade é a palavra! "Quando existe unidade numa dada família". Só se consegue criar unidade quando existe interação, quando existe um livre diálogo entre as partes. Se existe um bloqueio, se existe uma porta fechada, se existe a interrupção do diálogo, se existe a interrupção da consulta, se não existe o reconhecimento desta mina rica em jóias, o que tem a oferecer este novo elemento da família quando começa a expressar o seus pensamentos e opiniões? No momento em que existe esta conectividade a unidade começa a tomar forma. O que o texto acima destaca como conforto e tranqüilidade, não é material, porque o conforto e a tranqüilidade material hoje existem e amanhã podem não existir. Segurança e posição não são o reconhecimento da sociedade, mas de uma estrutura moral solidamente estabelecida, onde qualquer que seja o revés que a vida venha a provocar naquela família, ela tem um elemento que mantém o seu eixo central intacto.

Agora, dos filhos para com os pais, Bahá'u'lláh diz o seguinte:

"Honrai e homenageai vossos pais. Isto motivará bênçãos a caírem sobre vós das nuvens da generosidade de vosso Senhor o Exaltado e Grande. Acautelai-vos a fim de não cometer aquilo que causaria tristeza aos corações de vossos pais e mães. Segui o caminho da verdade, que é um caminho reto."

Bahá'u'lláh continua: "Se alguém vos der a escolha e a oportunidade de prestar um serviço a Mim ou a eles (vossos pais) escolhei servi-los e deixai que tal serviço seja um caminho guiando-vos a Mim.". Nós também temos que mostrar aos nossos filhos que esta estrada tem duas mãos. Que uma das mãos é a nossa missão para com eles, que é a nossa responsabilidade para com eles, mas a outra mão desta estrada é a conexão que eles criam conosco em reconhecimento a isto.

Existe um texto muito bonito de Abdu'l-Bahá em que ele fala que normalmente os pais nunca chegam a ver o resultado final da criação de seus filhos, porque quando alcançamos a nossa verdadeira maturidade é quando normalmente nossos pais já partiram deste mundo. Talvez este texto não venha a ser mais tão válido no futuro quando pudermos alcançar idades mais avançadas, mas por enquanto ainda é uma verdade. Que alegria maior do que podermos prestar aos nossos pais, enquanto vivos, o reconhecimento daquilo que eles fizeram por nós. Isto dá a outra mão desta estrada, cria o outro elemento. Eu colocaria dentro desta relação pais e filhos não só a relação de pai e mãe como exemplos, como elementos facilitadores do contato, do diálogo, como elementos construtores desta unidade na família, como aqueles que vão explorar esta mina e revelar estas jóias, mas também os filhos como geradores de energia, em retorno à energia despendida pelos pais. Acho que não há retorno de energia maior do que nós como pais sentirmos o amor e o reconhecimento de nossos filhos. Isto é o que dá força para continuarmos nossa caminhada. 

Gostaria de terminar então, com um texto que vale para todos nós como pais ou como filhos que somos:

"Por toda parte ouvem-se louvores a belas expressões e admiração a nobres preceitos. Todos os homens dizem que amam o que é bom e odeiam tudo o que é mau! A sinceridade deve ser admirada, ao passo que a mentira é desprezível. A fé é uma virtude e a traição uma desgraça para o homem. É uma coisa abençoada alegrar os corações dos homens e iníquo ser a causa de dor. Ser bom e misericordioso é correto, enquanto que odiar é pecaminoso. A justiça é uma qualidade nobre e a injustiça uma iniquidade. Deve-se ter piedade e a ninguém ofender; deve-se evitar inveja e maldade custe o que custar. A sabedoria é a glória do homem, não a ignorância; a luz, não a escuridão! É uma boa coisa volver-se a face para Deus e insensatez desprezá-Lo. É nosso dever guiar o homem para o alto, e não desencaminhá-lo e ser a causa de sua queda. Há inúmeros exemplos semelhantes.

Mas todas estas expressões são apenas palavras e vemos um pequeno número delas transformado em ação. Ao contrário, percebemos que os homens são impulsionados pela paixão e pelo egoísmo, cada homem pensando apenas naquilo que o possa beneficiar, mesmo que isto signifique a ruína de seu irmão. Todos estão ansiosos por fazer suas fortunas e pouco ou nada cuidam do bem-estar dos outros. Estão interessados em sua própria paz e conforto, enquanto que a condição de seus semelhantes absolutamente não os inquieta.

Infelizmente esta é a estrada que a maioria dos homens percorre.

Mas... não devem(os) ser assim, devem(os) superar esta condição. As ações devem significar mais... do que as palavras. Por (nossas) ações devem(os) ser misericordiosos e não simplesmente por meio de... palavras. Em todos os momentos, devem(os) confirmar por meio de (nossas) ações o que proclamam(os) em palavras."

Se estas palavras de Abdu'l-Bahá forem o elemento norteador do relacionamento entre pais e filhos, estaremos no rumo certo. Pois as crianças, já em tenra idade são espertas, tem uma sagacidade muito impressionante. Detectam em qualquer momento qualquer sinal de incoerência de discurso e ação. Por mais que nós digamos "faça o que eu digo, não faça o que eu faço" elas dirão "Eu não vou fazer o que você diz, porque o que você expressa palavras e não consegue realizar. Porque deveria eu me esforçar e me encher com uma carga de sentimento de culpa e incapacidade, se eu não fiz o que você dizia? Vou fazer o que você faz!" 

A grande escola na realidade é a escola das ações. Se conjugarmos estas diferentes etapas deste processo educativo, acho que conseguiremos propor um novo modelo de relacionamento entre pais e filhos, um novo modelo aonde esta educação não exista como uma coisa de cima para baixo, sentida como uma prepotência de pais que só admoestam e não instruem seus filhos, mas de aprendizes que caminham juntos.